terça-feira, 27 de dezembro de 2011

E, e, e - de Robin L. Silverman

No canto de minha escrivaninha há um bilhete, amarelando lentamente e enrugado
pelo tempo.
É um cartão mandado por minha mãe, contendo apenas quatro frases, mas com
impacto suficiente para mudar minha vida para sempre.
Nele, ela elogia, sem restrições, minhas habilidades como escritora. Cada frase está
cheia de amor, oferecendo exemplos específicos do que minha atividade significou para ela
e meu pai.
A palavra "porém" nunca aparece no cartão. Entretanto, a palavra "e" está lá quase
meia dúzia de vezes.
Sempre que o leio - o que acontece quase todos os dias lembro-me de perguntar a
mim mesma se estou fazendo a mesma coisa por minhas filhas. Perguntei-me quantas
vezes eu disse "mas" a elas e a mim mesma, afastando-nos da felicidade.
Odeio dizer que foi com mais freqüência do que eu gostaria de admitir.
Ainda que nossa filha mais velha normalmente só tirasse dez em seu boletim, nunca
houve um semestre em que pelo menos um dos professores não sugerisse que ela falava
demais em sala de aula. Eu sempre me esquecia de perguntar-lhes se ela estava
melhorando quanto ao controle de seu comportamento, se seus comentários contribuíam
para a discussão em andamento ou encorajavam um aluno mais calado a falar. Em vez
disso, eu ia para casa e a cumprimentava:
"Parabéns! Seu pai e eu estamos muito orgulhosos de suas realizações, mas será
que você poderia tentar baixar o tom em sala de aula?"
O mesmo era verdade para nossa filha mais nova. Como sua irmã, ela era uma
criança adorável, inteligente, articulada e amigável. Ela também trata o chão de seu quarto
e do banheiro como um armário, o que me levou a dizer, em mais de uma ocasião: "Sim,
este projeto é ótimo, mas arrume o seu quarto!"
Percebi que outros pais fazem a mesma coisa: "Toda a nossa família estava junta no
Natal, mas Kyle escapuliu cedo para brincar com seu novo jogo de computador", "O time de
hóquei ganhou, mas Mike deveria ter feito aquele último gol", "Amy é a Rainha da
Primavera, mas agora quer duzentos dólares para comprar um vestido e sapatos novos".
Mas, mas, mas.
Ao contrário, aprendi com minha mãe que, se você quer realmente que o amor flua
para seus filhos, comece a pensar "e, e, e...".
Por exemplo: "Toda a nossa família estava junta no jantar de Natal, e Kyle conseguiu
ficar craque em seu novo jogo de computador antes que a noite tivesse terminado", "O time
de hóquei ganhou e Mike fez o melhor que pôde durante todo o jogo", "Amy é a Rainha da
Primavera e ela vai estar linda!".
A verdade é que "mas" não nos faz sentir bem e "e" faz. E quando falamos de nossos
filhos, sentir-se bem é o que temos que fazer. Quando se sentem bem a respeito de si
mesmos e do que estão fazendo, fazem ainda mais, aumentando sua autoconfiança, seus
critérios e as conexões harmoniosas com os outros. Quando tudo o que dizem, pensam ou
fazem é qualificado ou desprezado de alguma maneira, sua felicidade azeda e sua raiva
aumenta.
Isso não quer dizer que as crianças não precisam ou não irão corresponder às
expectativas de seus pais. Precisam e vão, independente dessas expectativas serem boas
ou ruins. Quando essas expectativas são consistentemente inteligentes e positivas e então
são ensinadas, modeladas e expressas, coisas inacreditáveis acontecem:
"Vejo que você cometeu um erro. E sei que você é inteligente o bastante para
descobrir o que fez errado e tomar uma decisão melhor da próxima vez." Ou: "Você está há
horas trabalhando nesse projeto. Adoraria que o explicasse para mim." Ou: "Nós
trabalhamos duro para ganhar dinheiro e sei que você pode nos ajudar a descobrir um jeito
de pagar pelo que você quer."
Não basta dizer que amamos nossos filhos. Em uma época em que a frustração
cresceu aterradoramente, não podemos mais nos dar ao luxo de limitar a expressão do
amor.
Se quisermos diminuir o som da violência em nossa sociedade, te
remos que aumentar o volume da atenção, do elogio, da orientação e da participação
no que é correto para nossos filhos.
"Chega de mas!" é o toque de chamada para a felicidade. Também é um desafio, a
oportunidade fresca diante de nós, todos os dias, de concentrarmos nossa atenção no que é
bom e promissor a respeito de nossos filhos e de acreditarmos de todo o coração que eles,
eventualmente, serão capazes de ver o mesmo em nós e nas pessoas com quem, no final,
irão viver, trabalhar e servir.
E, se algum dia eu me esquecer, tenho o bilhete de minha mãe para lembrar-me.

"50 Histórias Para Aquecer o Coração"

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